UM OLHAR MAIS ATENTO

 

 

UMA CRÓNICA ANCESTRAL DE DESASTRE TEM UMA MENSAGEM VITAL PARA OS DIAS DE HOJE

 

            O Livro de Juizes do Velho Testamento conta-nos a história do que pode ser chamada a “Era das Trevas” do Povo Escolhido.  Na sua abertura, as doze tribos de Israel estão no auge  do sucesso nacional.  Sob a liderança de Moisés e de Josué, o seu sucessor, foram libertados da escravatura e começaram a ocupar e instalarem-se na sua Terra Prometida. Mas algo de errado se passa.

            Quando chegamos ao final do livro, não existe liderança e as tribos estão umas contra as outras, um cauge. O Povo Escolhido  enfrenta, por todos os lados, a opressão  dos inimigos  e o perigo de se extinguir como nação. Este livro contém algumas das histórias mais arrepiantes da Bíblia – episódios de idolatria, roubo, violação, homicídio e guerra civil.

            O que foi que aconteceu de errado? Vamos ver mais de perto.

 

Não chegaram a lado nenhum

Depois da morte de Josué, ao Israelitas precisavam de um novo líder. Eles perguntaram,” Quem dentre nós subirá primeiro aos cananeus, para pelejar contra eles?” (Juízes 1:1). Deus escolheu a tribo de Judá “eis que entreguei a terra na sua mão.” (versículo 2).

            Infelizmente, a fé de Judá começou a decair mesmo antes de eles porem o pé no campo de batalha.  Em vez de tomarem como certa a palavra de Deus, pediram suporte militar adicional à tribo de Simeão (versículo 3).Um preço muito alto que não tardaram em pagar.

            Embora Judá tenha conquistado várias áreas de Negebe e baixadas ocidentais, assim como cidades como Hebrom e Debir , a sua vitória foi lastimavelmente incompleta.  Jerusalém, por exemplo, não foi tomada completamente ou foi, mais tarde, recapturada pelos seus habitantes (Juízes 1:8,21). Na realidade, esta cidade fortaleza, não foi, efectivamente, tomada até

ao reinado de Davi, centenas de anos mais tarde.

            O padrão de fracasso foi repetido através do país, já que as várias tribos sofreram colapsos militares. Devido ao seu pacto com Deus, o sucesso não seria devido à sua superioridade militar ou ao brilho das suas tácticas. Foram superados, pelos seus inimigos, em número e em armas.  Se foram bem sucedidos na ocupação da Terra Prometida, seria porque apoiaram-se em Deus.

            Esqueceram-se disso, e como resultado:

·         Manassés  fracassou em Bete-Seã, Taanaque, Dor, Ibleão e Megido. (Juízes 1:27)

·         Efraim fracassou em Gezer (versículo 29)

·        Zebulom fracassou em Quitrom e em Naalol (versículo 30)

·        Aser fracassou em Aco, Sidom, Alabe, Aczibe, Helba, Afeca e Reobe. (versículos 31-32)

·        Dã fracassou contra os amorreus. (versículo 34)

·        A casa de José também fracassou em expulsar os amorreus. (versículos 35-36)

Um pacto quebrado

Era intenção de Deus fazer de Israel uma nação santa. Com este fim, Ele fez um pacto sagrado  com eles no Monte Sinai (Êxodo 19:5-8; 24:1-8).

Quanto aos Israelitas tinham de amar Deus e obedecer à sua lei (Deuteronómio 6:5; Josué 22:5).  Teriam de seguir as ordens de Deus, em particular, não fazendo qualquer tipo de tratados com as outras  nações pagãs (Êxodo 34 :11-16; Deuteronómio 7:1-5).

            Mas, quando os anciãos que serviram com Josué, também morreram, o povo afastou-se de Deus. A nova geração abandonou a fé dos seus pais e começou a adorar os deuses dos cananeus (Juízes 2:10-25). A idolatria foi, certamente, a maior causa do declínio neste período da história de Israel – afastarem-se do único Deus verdadeiro para seguirem deuses pagãos.

Quando Israel rejeitou Deus, o seu acordo em ajudá-los a conquistar a terra  e afastar as nações pagãs de Canaã já não estava em vigor. Deus enviou um anjo para lhes lembrar das extremas consequências da sua desobediência:O anjo do Senhor subiu de Gilgal a Boquim, e disse: Do Egito vos fiz subir, e vos trouxe para a terra que, com juramento, prometi a vossos pais, e vos disse: Nunca violarei o meu pacto convosco; e, quanto a vós, não fareis pacto com os habitantes desta terra, antes derrubareis os seus altares. Mas vós não obedecestes à minha voz. Por que fizestes isso? Pelo que também eu disse: Não os expulsarei de diante de vós; antes estarão quais espinhos nas vossas ilhargas, e os seus deuses vos serão por laço” (Juízes 2:1-3).

            E foi, exactamente, o que aconteceu: “Os israelitas mantiveram-se nas montanhas, mas os estrangeiros ficaram com os vales, atravessando a terra, separando as tribos. Em breve, cada grupo de israelitas isolados começaram a funcionar independentemente...A geração seguinte perdeu a sua identidade nacional...Embora descendentes de 12 irmãos, os israelitas passaram mais tempo a lutarem entre si do que contra os opressores estrangeiros” (Nova Bíblia Estudantil pg. 228-229)

 

Variações sobre um tema

            Embora a anarquia existisse em Israel durante a maior parte do período dos juízes, a história mostra que Deus ainda estava com eles. Na verdade, toda a história é um monumento à paciência, amor e misericórdia de Deus. Vez após vez, o povo prendeu-se a um espiral descendente, em direcção à degeneração da moral, e o refrão, “ Mais uma vez, os israelitas fizeram o que era mau aos olhos de Deus” reaparece, em todo o livro, como uma litania monótona. Apesar disso, sempre que os Israelitas se arrependiam, Deus perdoava-os e enviava um libertador (ou “juíz” daí o nome do livro).

 

Os Juízes de Israel

            Seis juízes tiveram uma parte significativa durante este período turbulento, na história de Israel: Otiniel (3-9), Eúde (3:15), Débora (4:4), Gideão (6:11), Jefté (11:1), Sansão (13:24).

            Seis juízes menos importantes são, também, mencionados no livro, embora muito pouco seja dito sobre eles: Sangar, (3:31), Tola (10:1), Jair (10:3), Ibsã (12:8), Elom(12:11),  Abdom(12:13)

 

            A secção central do livro (capítulos 3:7-16:31) fala-nos de seis juízes que Deus elevou para salvar o seu povo dos seus inimigos. Estas histórias, com o seu padrão do pecado, sofrimento, arrependimento e restauração de Israel, ilustram o que é, frequentemente, designado como o “ciclo do pecado”.

            As histórias, à primeira vista, parecem, todas, seguir o mesmo tema.  Contudo existam diferenças subtis e importantes.  Estas pequenas divergências são importantes, tanto como, quando um músico executa variações num tema

            Primeiro ouvimos, o que pode ser chamado, o tema “base”.  Depois é tocado novamente, com algumas variações.  Enquanto as variações estão a ser desenvolvidas, o tema base retrocede mais e mais, podendo mesmo deixar de ser reconhecível ao ouvido destreinado. No entanto, o ouvinte treinado pode apreciar o que está a acontecer.

            O cronista de Juízes usa muito esta técnica, e precisamos de ler, cuidadosamente, para, realmente, apreciar a lição. Não são apenas histórias – são uma variação de um tema.

            A primeira história é sobre Otiniel (Juízes 3:7-11). Ele era o sobrinho de Caleb, um dos heróis fundadores da nação (ver Números 14:6,30).  Este pequeno relato de Otiniel é o “tema base” – o que nos leva a entender os outros. Enquanto se lê, procura-se a seguinte sequência:

·        Os Israelitas praticam o mal (versículo 7).

·        Deus permite-lhes tornarem-se cativos dos seus inimigos (versículo 8).

·        Os Israelitas arrependem-se e pedem a ajuda de Deus (versículo 9).

·        Deus entrega o líder inimigo nas mãos do Juíz (versículo 10).

·        A nação tem paz e descanso sob a liderança do juíz (versículo 11).

As histórias dos outros cinco juízes têm, também, os primeiros dois elementos: o povo a pecar e a tornar-se cativo.  No entanto, as histórias seguintes afastam-se, progressivamente, da história modelo, no que diz respeito aos outros quatro elementos.  Esta afastamento progressivo da história modelo é um meio literário que o autor usa para reflectir o declínio moral de Israel.

A segunda história sobre Eúde, segue, quase com exactidão, a história modelo (Juízes 3:12-20).

No entanto, na terceira, Baraque,  um líder militar capaz, mostra uma inicial falta de fé (Juízes 4:8). Tendo-lhe sido dito por Débora, uma profetiza e juíza, que Deus entregaria o inimigo nas suas mãos, Baraque ainda não está preparado para salvar Israel até que tenha, na batalha, a segurança adicional  da presença de Débora (Juízes 4:4-8).  Consequentemente, a honra de matar o líder inimigo, Sísera, vai para uma mulher, Jael, e não para Baraque (versículos 9, 15-21).

O próximo juíz, Gideão, requer muito mais do que o apoio de um profeta ou profetiza, enviados por Deus. Ele pede a Deus vários sinais específicos, antes de estar preparado para aceitar a responsabilidade (Juízes 6:17,36-37,39). Tendo em mente o que está por trás da experiência de Baraque, não nos surpreende que a glória de capturar dois dos líderes Medianitas, Orebe e Zeebe, não vai para Gideão, mas sim para a tribo rival de Efraim (Juízes 7:24-25).

A história de Jefté, desvia-se ainda mais. O povo e não Deus, elegem Jefté como seu líder (Juízes 11:1-40). E, apesar de Deus garantir a Jefté a vitória sobre os seus inimigos, o seu regresso triunfante, a casa, é transformado numa desilusão e angústia pessoal devido a um voto imprudente que ele fez a Deus. (Juízes 11:30-31).Além disso, a nação não tem paz sob a liderança de Jefté.

O episódio final, o de Sansão (Juízes 13-16), representa o afastamento mais radical, do modelo ideal de salvamento.  O povo nem sequer pede ajuda a Deus, a nação não tem descanso sob a liderança de Sansão, e, ele próprio é um homem obstinado, que, no princípio, parece mais intencionado em preencher a sua própria agenda do que ser um servo de Deus.  Se Baraque está a ser criticado por colocar demasiada dependência na presença de uma profetiza leal, Débora, quanto mais Sansão que confia demasiado numa exploradora ilícita Filisteia, Dalila (Juízes 16:21).  Sansão salva, eventualmente, o seu povo, mas só depois de ser capturado pelos seus inimigos, terem-no cegado e feito dele escravo.

Portanto, o que temos é uma sequência triste de declínio e decadência moral.  Quando o livro começa, os Israelitas serviam Deus sob a liderança de Josué e dos anciãos que lhe sobreviveram. Mas acaba  com esta trágica nota: “Naqueles dias não havia rei em Israel; cada um fazia o que parecia bem aos seus olhos” (Juízes 21:25).

 

Cristo quebra o ciclo do pecado

Arthur Cundall, letrado do velho Testamento identifica a mensagem principal do livro de Juízes: “O período dos juízes... é um testemunho fiel da fraqueza do homem e da sua necessidade de um Salvador eterno que pode efectuar uma redenção perfeita e não de um salvador meramente temporário”  (Arthur E. Cundall, ‘Judges’, The Tyndale Old Testament Commentaries, vol. 7, p 45).

O comentário de Cundall poder-se-ia, também, aplicar à história do mundo moderno.  Nós vivemos numa sociedade que é, supostamente, muito mais ‘sofisticada’ e ‘esclarecida’ do que a da antiga Israel, contudo, muito do nosso comportamento tem sido tão bárbaro e desleal como o dos Israelitas.  A nossa sociedade, tal como a deles, continua a ser “ uma testemunha fiel da fraqueza do homem e da sua necessidade de um Salvador eterno”.

As boas novas do evangelho é que existe um Salvador eterno que já quebrou o ciclo do pecado pela afectação de uma redenção perfeita para o mundo inteiro. Ele é o Deus – homem, Jesus Cristo.  E a mensagem básica do livro de Juízes do Velho Testamento – que o pecado leva à escravidão enquanto que o arrependimento leva à redenção – ajusta-se perfeitamente ao ensinamento do Novo Testamento que, devido ao facto de Jesus ter morrido pelos nossos pecados, Deus garante-nos o arrependimento e salva-nos da escravatura espiritual.

 

                                                                     

 

                                   Por: Jim Herst e Tim Finley

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The Plain Truth  - A Pura Verdade

Agosto-Setembro 2001

            Tradução: Conceição Galego